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sábado, 14 de outubro de 2017

PAUL McCARTNEY - PORTO ALEGRE, 13 DE OUTUBRO DE 2017

Foto: PMC oficial

Tem uma coisa que aprendi com as crianças. Elas têm seu próprio tempo. E não adianta forçar a barra e tentar impor nossas preferências como sendo as mesmas que movem o interesse delas. Afinal, também já fomos crianças. Assim, como o passar dos anos, sabemos que não necessariamente, por exemplo, nossos filhos irão herdar nosso gosto musical. No entanto, invariavelmente essas sementes germinam. Aos 17 anos, Guilherme, meu filho, além de ser ouvinte assíduo de bandas como Artic Monkeys e Red Hot Chili Peppers – também é um convicto fã de Beatles. Tudo começou aos 10 anos, em 2010, quando Paul McCartney passou pela primeira vez em Porto Alegre. Não o levei na época para vê-lo, e até hoje me lamentava. Sem problemas, em 2014 tive uma nova chance, pois comprei ingressos para assisti-lo em Montevidéu, no Uruguai. Dessa vez ele iria comigo. Mas... Tivemos um contratempo e nossa expectativa foi frustrada. Por isso, logo que saiu o anúncio da segunda vinda de Paul na capital gaúcha, não tive dúvida: garanti o ingresso do guri! É curioso, mas assistir a um show de Paul McCartney inspira sentimentos como esse: você quer curtir o show ao lado de quem ama.

Leia resenha do show de Paul McCartney em 7.11.2010

Foto: Ton Muller

Fim de tarde início de noite, cá estamos nós em um dos eventos musicais do ano no RS, chance de ver de perto o tour “One On One”. Antes do espetáculo, filas monstruosas serpenteiam pelo complexo do Beira-Rio (nunca vi maiores), além de todo aquele fuzuê pré-show. Na verdade, desde a terça-feira (10) fãs já começaram a se amontoar aos poucos para garantir um lugar o mais próximo possível em frente ao palco. E quem novamente marcou presença em um evento com ares históricos como esse foi a mau tempo. Depois da lição de ter visto os Rolling Stones totalmente encharcados, dessa vez um exército ainda maior de pessoas vestidas em diversos modelitos de capa de chuva tomou conta do Beira-Rio. Um alerta quanto as expectativas de previsão do tempo para as horas que compreenderiam o espetáculo foi postado pelo próprio artista em sua página oficial. Ao som de "Ob-La-Di, Ob-La-Da", veja o vídeo.


Entramos no estádio no finalzinho da apresentação de abertura, assim, infelizmente podemos assistir apenas os últimos instantes do show de Frank Jorge e Luciano Albo, presenças legítimas como preâmbulo do evento. Uma das principais expectativas dos fãs mais ferrenhos era tentar adivinhar as possibilidades de setlist. Quem chegou mais cedo ao Beira-Rio ganhou um presente: pode ouvir a passagem final de Paul e banda. Entre as músicas tocadas, clássicos do Beatles como "Honey Don't", "Drive My Car" e "Things We Said Today", canções que certamente não desagradariam o público de cerca de 50 mil presentes. 

Dois minutos passados da 21h, uma chuva fina cai novamente sobre Porto Alegre - ela foi e voltou várias vezes, legitimando o uso permanente dos impermeáveis-, eis que o beatle finalmente começa sua apresentação. Uma das marcas que assombram de cara os desavisados é toda a estrutura de som/luz/palco e os gigantescos telões que aproximam Paul de qualquer fã. Abertura com "A Hard Day's Night" joga ainda mais gasolina numa caldeira pronta para explodir. É noite de festa! E nem só de beatle songs se faz um set, "Junior's Farm" nos relembra o quanto o Wings era um grande banda de rock'n'roll. "É bom estar de volta", nos diz Paul em português, e logo depois ouvimos "Can't By Me Love", clássico ilustrado com imagens dos tempos da beatlemania a colorir o telão no fundo de palco. O coração dispara, meu filho canta a plenos pulmões. Um curiosidade: em comparação ao show de Paul de 2010, realizado também no Beira-Rio, a apresentação de 2017 tem cerca de  metade de canções diferentes, revelando um remodelamento de setlist.   

Foto: Ton Muller
Com "Jet" o estádio permanece em nível de histeria controlada. Particularmente, não consigo imaginar um show de Maca sem essa trilha ecoando das caixas de som. E eis que ouvimos uma das primeiras surpresas do set: "Got To Get Into My Life", uma das minhas preferidas de "Revolver", tentativa inicial de espelhar o som da Motown e que ainda vibra como uma das melhores canções da segunda metade dos anos 1960. Logo depois, Paul larga o baixo Hoffner e pega uma guitarra Gibson, mandando ver no riff de "Let Me Roll It", onde novamente o rock setentista marca sua presença, com direito a falso final e medley com "Foxy Lady" de Jimi Hendrix. "I've Got A Feeling" nos evoca novamente a presença de John Lennon, quando Rusty Anderson (guitarra e vocais) canta a parte correspondente a John numa das canções que certamente apontavam para o futuro dos Beatles nos anos 1970, caso tivesse seguido juntos. 

Foto: Ton Muller
Então Paul migra para o piano, dedicando "My Valentine" para sua atual namorada, Nancy Shevell. No telão, imagens da atriz Natalie Portman e do ator Johnny Depp 'declamando' a letra na linguagem de sinais. Ainda ao piano, "Nineteen Hundred One Eight Five" e "Maybe I'm Amazed" soterram expectativas negativas em relação a performance vocal de Paul. Sim, ele ainda continua cantando muito bem! Assombrosamente para uma artista que há mais de 50 anos continua se desafiando do alto de seus 75 anos.

Nova reconfiguração no espetáculo, e outro  grande momento da noite passa por arranjos acústicos de "We Can Work it Out" e "In Spite Of All The Danger", primeira canção gravada pelos Beatles num estúdio caseiro em Liverpool. "Tri bom", disse Paul elogiando o coro da audiência. O mesmo acontece em "You Won't See Me", executada ainda com o beatle ao violão e Abe Laboriel Jr (bateria) em pé, utilizando um kit menor de seu instrumento localizado mais a direita do palco, assim como "Love Me do" (dedicada ao produtor George Martin), temas que inevitavelmente ganham a adesão vitalícia do público. Fechando essa etapa do show, "And I love Her" e "Blackbird" (onde ele chama atenção que a canção tem como tema os direitos humanos, que no final ainda ganha gritos de 'Fora Temer' do público), além de "Here Today", canção dedicada ao amigo John Lennon, composta logo após a sua morte em 1980. É quando espio meu filho e vejo lágrimas nos seus olhos. Dou um forte abraço no guri. 

Voltando ao rock, "Queenie Eye" e "New" revelam a sincronia de Paul com os tempos atuais, canções que soam tão boas quanto muitos de seus clássicos (por que as rádios daqui não as tocam?), e que ainda são mantedoras de suas principais características como compositor. "Lady Madona", outro standard em que o piano permanece no centro das atenções, antecede "FourFiveSeconds", hit composto em parceria com Rihanna e Kanye West, e que conta com adesão maciça da parcela mais jovem do Beira-Rio. A quase erudita "Eleanor Rigby", com strings a cargo de  Paul Wickens (teclados, percussão e gaita de boca), ganha também os backings no refrão de Laboriel e Anderson. Logo depois, segue uma série de canções em que o artista homenageia seus velhos companheiros de banda. Se "I Wanna Be Your Man" traz a permanente lembrança de Ringo, Paul também rememora Lennon em "Being For The Benefit of Mr. Kite", fábula circense composta pela dupla para o álbum "Sgt. Pepper's". Já George revive no arranjo com ukulele logo no início de "Something", uma das mais belas canções de amor de todos os tempos. E "A Day in The Life", o mais próximo que os Beatles se aproximaram da ópera rock, surge mesclada a "Give Peace a Change", manifesto de John ao pacifismo. Assim, Maca fecha esse recorte de homenagens aos colegas, mostrando que ainda continua exercendo a posição de guardião do legado dos Beatles.

Foto: Márcio Grings
Chegando a parte final da noite, "Ob-La-Di, Ob-La-Da", um som que nunca esteve entre minhas escolhidas do Fab Four, soa monstruosamente adequada ao momento, um convite a alegria de estar num show de rock, transformando instantaneamente o Beira-Rio num gigantesco salão de baile: "Apenas um cara como Sir Paul pra fazer o povo gostar dessa música ao vivo", disse o amigo Cristiano Radtke. "Band on The Run" é um daqueles tipos de temas em que a genialidade de quem a compôs está emoldurada para sempre em nossa memória. Quando Brian Ray (guitarra e baixo) aparece  no telão sorrindo, todos sabemos que estamos prontos a cantar o refrão a plenos pulmões. 

Foto: Márcio Grings
Em "Let It Be" milhares de celulares tremeluzentes brilham pelos quatro cantos do estádio. Para "Live and Let Die", a pirotecnia toma conta do palco não apenas com chamas, fogos de artifícios, mas principalmente como espetáculo visual que deixa ainda mais coloridos os olhos do meu filho. Olho para ele em "Hey Jude" e percebo a comoção fluindo livre em todo o seu corpo e espírito: "Blackbird, Hey Jude, Love Me Do e Live and Let Die, gostei de tudo, mas essas foram demais", aponta Guilherme que volta pra casa com um camiseta da banca oficial.

Paul e banda saem de cena e retornam logo em seguida com bandeiras do Brasil, da Grã-Bretanha e do movimento LGBT. Novamente ao violão com "Yesterday", eis uma música que sempre sou como número solo de Maca, mesmo durante a época em que a tocava na banda. "Sgt. Pepper's (reprise)" e "Helter Skelter" emergem com sabor agridoce de adeus ao tour "One On One".

Veja um trecho de "Golden Slumbers"


No entanto, esse tête-a-tête final teria ainda quatro fãs dançando no palco no que Paul autointitulou 'festa de aniversário coletiva' em "Birthday". Dá pra imaginar a euforia dessas meninas? Vestidas como 'Sgt. Pepper's Girls' Gabriela, Daniela, Skelter e Celeste não cabiam em si. E tudo termina com um dos medleys mais incríveis da história do rock: "Golden Slumbers", "Carry That Weight" e "The End", enceramento de "Abbey Road" (1969). "Pra mim, essa trinca é uma das melhores obras já gravadas em todos os tempos, ouvi-las ao vivo [e por um dos compositores que a concebeu], não tem preço", disse o amigo Cristiano Radtke. 

Foto: Márcio Grings
Já Lennon Schwarcz (sim Lennon também esteve no Beira-Rio), que veio de excursão de Santa Maria, resume da segunte forma: "A melhor frase que eu encontro pra tentar explicar a experiência transcendental foi dita por um parceiro de excursão: 'depois do selo de qualidade do Tio Paul vai ser difícil retornar pra nossa humilde existência'. Lennon ainda levanta outra lebre: "A única dúvida que me assombra a mente é a seguinte: se um beatle sozinho faz tudo isso, que magnitude tinham os 4 reunidos?! O jornalista Lúcio Brancato, que estava a cerca de quatro metros da grade, bem em frente ao palco, também exalta a epifania vivida na última sexta-feira em Porto Alegre: "Já tive a oportunidade de vê-lo quatro vezes, essa certamente foi a mais impressionante". Já meu filho, que pela primeira vez teve a experiência de conferir um show internacional, subtrai e resume com perfeição sua experiência: "Estou cansado, mas feliz". Mais feliz está o pai dele com essa passagem de cetro. Agora é tudo contigo, garoto! Prossiga...

Veja um trecho de "Hey Jude". 


Próxima parada do tour "One On One" no Alianz Park, em São Paulo, no domingo (15). Grings - Tours, Produções e Eventos (Santa Maria) e Jamil Magic Bus (Passo Fundo) agradecem a mais de duas centenas de clientes que escolheram compartilhar experiências conosco. Até o próximo tour. Nosso agradecimento especial a Agência Cigana pelo suporte e credenciamento.    

Setlist Paul McCartney "One On One Tour 2017" Porto Alegre

A Hard Day's Night
Juniors Farm
Can't Buy Me Love
Jet
Got to Get You Into My Life
Let Me Roll It/ Foxy Lady
I've Got A Feeling
My Valentine
Nineteen Hundred and Eighty Five
Maybe I'm Amazed
We Can Work it Out
In Spite Of All The Danger
You Won't See Me
Love Me Do
And I Love Her
Blackbird
Here Today
Queenie Eye
New
Lady Madonna
FourFiveSeconds
Eleanor Rigby
I Wanna Be Your Man
Being for the Benefit Mr Kite
Something
A Day In The Life / Give Peace A Change
Ob-La-Di, Ob-La-Da
Band On The Run
Back in the USSR
Let it Be
Live and Let Die
Hey Jude

Bis

Yesterday
Sgt Pepper Reprise
Helter Skelter
Birthday
Golden Slumbers
Carry That Weight
The End   

Nosso colaborador, o fotógrafo Ton Muller, fez um videoreprise da apresentação. Vale o clique.
  

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