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quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

DEEP PURPLE - CURITIBA, 12 DE DEZEMBRO DE 2017

Fotos: Ton Muller
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Texto Márcio Grings Fotos Ton Muller

Depois da abertura com Tesla, do show empolgante do Cheap Trick, o minifestival Solid Rock fecha a noite da última terça-feira (12) na Pedreira Paulo Leminski com sua principal atração, o grupo inglês Deep Purple. Eles estão se despedindo das grandes turnês, pelo menos esse é o anúncio. Conviver com essa permanente sensação de que nossos ídolos estão pendurando as chuteiras é um bad feeling difícil de se afugentar! Por isso, vejo muita gente passando o rodo em diversos shows internacionais que cruzam pelo país (me coloque nesse saco de gatos). Acredito que para muitos dessa casta artística  que beira os 70 anos, a decisão de parar é um mantra que ressoa como o sino do coveiro. Ou quem sabe, o orgulho próprio caminhe de mãos dadas com a impressão de dever cumprido. O que posso afirmar é que assistir ao Deep Purple pela segunda vez, apenas três anos após a última passagem deles pelo Brasil, ainda é algo impressionante. Mesmo com amargo sabor de adeus, devido a essa despedida anunciada, por enquanto o que sabemos é que a 'The Long Goodbye Tour" segue até julho de 2018. Bem, alguns de nós tivemos a sorte de presenciá-la. 

Vale lembrar que depois de anos empilhando álbuns com carimbos protocolares, eis que o Deep Purple novamente lança um disco digno da sua grandeza. "inFinite" tem a marca do som que consagrou o quinteto na primeira metade dos anos 1970. Basta ouvir canções como "Time For Bedlan" e "Hip Boots" para sacarmos o calibre do álbum. Ouça os teclados de Don Airey - eles nunca soaram tão viscerais; já Steve Morse, como de costume engaveta qualquer lembrança de Ritchie Blackmore (se é que isso é possível para os fãs  mais ferrenhos). 

Com fotos de Fabiano Dallmeyer, LEIA a resenha do show do Deep Purple em 2014 (Porto Alegre) 

Foto: Ton Muller
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De todo o modo, mesmo que o grupo tenha colocado no setlist até mesmo cinco canções de "InFinite" em alguns do shows desse ano na Europa, isso não acontece em Curitiba, quando apenas "Birds of Prey" surge como representante do novo álbum. Quem se importa? 

A noite púrpura começa com o implacável compasso 5/4 de " Mars, the Bringer  of War", trilha incidental composta pelo compositor erudito inglês Gustav Holst, peça sinfônica análoga aos planetas do Sistema Solar. E já que estamos falando do Cosmo, nada melhor que uma estrela cadente riscar o céu curitibano. "Highway Star", abre alas de "Machine Head", é também o pontapé inicial da maioria dos shows do Purple. Segundo o site setlist.fm, essa foi a execução de nº 1.718 da canção lançada originalmente em 1972. A primeira vez que "Highway Star" surgiu em uma apresentação foi em 6 de Fevereiro de 1971, em Shefield, na Inglaterra. 45  anos depois, ver Gillan, Glover e Paice (três compositores originais) impondo respeito com um dos principais brasões do rock em todos os tempos, ainda nos impressiona. De igual forma, "Pictures of Home" é também uma marca registrada do som do Purple, ainda que agora um norte-americano, o guitarrista Steve Morse, substitua com louvores o criador original do riff, Mr. Ritchie Blackmore. E se Gillan conseguiu se livrar de Blackmore (as brigas entre o ex-guitarrista e o vocalista sempre foram lendárias), em "Bloodsucker" ele mostra como ainda consegue dar conta do recado, e com louvores, numa das faixas mais 'gueludas' de "In Rock" (1970). Esse Gillan amaciado pelo tempo também distribui carinho e mantém uma constante troca de olhares com seu guitarrista, e assim, o clima no palco é o melhor possível.  

Foto: Ton Muller
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Logo depois, "Strange Kind of Woman", o mais radiofônico dos hits forjado na era Blackmore/Gillan/Glover/Lord/Paice, funciona como uma canção novinha em folha. No solo, Morse desconstrói a linha original para deixar a sonoridade mais ao seu estilo. Depois de engatar quatro músicas emendadas uma a outra, só então Gillan saúda o público na Pedreira. Uncommon Man", de "Now What!?" (2013), é dedicada ao lendário tecladista e membro fundador do grupo, Jon Lord, falecido em 2012. Uma música aonde percebe-se com facilidade as reverências - e referências - ao legado de Lord como um dos maiores nomes do teclado no rock. "Lazy" pode soar diferente de uma noite para a outra, pois a marca do improviso está diluída em sua gema. Temos até o blues na gaita de boca de Gillan; já Glover crava um walking bass jazzístico em uma das bases de improvisação; no entanto, o ponto alto da performance certamente está permanente diálogo entre Don Airey e Steve Morse.      

Foto: Ton Muller
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"Birds of Prey", insígnia representativa de "inFinite", possui o espírito das velhas canções do grupo, porém é uma vinha extraída da colheita mais recente do Purple. Dá pra perceber que Gillan busca reforço no teleprompter para não tropeçar na letra. De todo modo, essa nova peça no repertório é também um reflexo de que essa formação, a mais estável na história do Purple (são 15 anos gravando e tocando juntos), também revela faixas dignas de evidência no tour. Se tem um disco que mora nos corações dos fãs da banda, esse álbum chama-se "Perfect Strangers" (1984), trabalho que marcou o retorno do grupo após um hiato de 8 anos inativo. Quando ouço ao vivo "Knocking at Your Back Door", um número com sutil referências a sexo anal (tema confirmado por Gillan em uma entrevista), a canção ainda soa poderosa como a gravação original. Mesmo que rearranjada, mais lenta e num tom confortável para equalizar as limitações de um vocalista que já passou dos 72 anos, podemos destacá-la como um dos grandes momentos do espetáculo. Eu, mais uma vez voltei aos 14.

Foto: Ton Muller
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Como notáveis instrumentistas, não são Ian Paice ou Steve Morse a estrelar momentos individuais no atual show do Purple. Nada de longos solos solitários de bateria ou guitarra. Esse momento solo fica a cargo do tecladista Don Airey, que após passar por bandas como Rainbow e Whitesnake, estabilizou no Purple como um dos melhores representes da escola de Jon Lord (os dois eram amigos). Entre acentos sinfônicos, eruditos, hammonds ora raivosos, ora fantasmagóricos, o músico ainda homenageia grandes compositores brasileiros como Zequinha de Abreu (Tico-Tico no Fubá) e Ari Barroso (Aquarela do Brasil), para no final sampar o mais celebrado dos riffs de teclado do seu predecessor no Purple. "Perfect Strangers" não ganha o quilate de 'clássico' por acaso. Trata-se de uma das canções mais importantes da história do grupo, porque além de marcar seu renascimento como banda de primeiríssima grandeza, a música passou a ser um tema impossível de ser riscada de qualquer setlist da banda. Nenhuma letra foi cantada mais alto na primeira edição do Solid Rock em Curitiba. E se "Space Truckin" nos leva de volta ao espírito dos shows ao vivo do Purple nos anos 1970, quando tudo soava ainda melhor ao vivo, "Smoke on the Water", umas das sequências de acordes mais repetidas de todos os tempos por qualquer moleque que algum dia pegou uma guitarra na mão, nos leva ao topo do Olimpo de hard rock mundial. É como se estivéssemos assistindo de camarote a uma final de Copa do Mundo.

Foto: Ton Muller
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E sem tentar inventar a roda, mas fazendo o mais previsível bis que o Deep Purple pode nos apresentar (quem disse que um bom clichê não pode ser repetido?), "Hush" clássico de Joe South que o grupo surrupiou para si (os medíocres copiam, os gênios roubam), mesmo assim podemos nos surpreender com uma introdução de "Peter Gunn  Theme" (ao estilo dos Blues Brothers), como também o último capítulo da noite, "Black Night", single ancestral lançado em 1970, é adesivado por enxertos de "How Many More Times" do Led Zeppelin.       

Se esse foi o fim, só saberemos nos próximos meses. O que podemos afirmar é que se o adeus está consumado, então tivemos uma despedida digna dos monstros sagrados da música. E só alguém muito estúpido para não sacar o tamanho do Deep Purple dentro do espectro do rock mundial.   
                
Setlist DP no SR em Curitiba

Intro: Mars, the Bringer of War (Holst)
Highway Star
Pictures of Home
Bloodsucker
Strange Kind of Woman
Uncommon Man
Lazy
Birds of Prey
Knocking at Your Back Door
Perfect Strangers
Space Truckin'
Smoke on the Water

Encore:

Hush   
Black Night

Foto: Ton Muller

Foto: Ton Muler

Foto: Ton Muller

Foto: Ton Muller

Foto: Ton Muller

Foto: Ton Muller


2 comentários:

  1. Resenha melhor impossível. Estive no show com minha esposa e filhos e vimos o mesmo show que você, detalhou perfeitamente o que aconteceu nesta noite épica, como o próprio Purple escreveu em seu face... Parabéns pela resenha. Que sorte termos assistido esse show lendário na velha e maravilhosa Pedreira.

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