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sábado, 12 de novembro de 2011

NAZARETH - SANTA MARIA, 11 DE NOVEMBRO DE 2011

Fotos: Fabiano Dallmeyer
Review Márcio Grings Fotos Fabiano Dallmeyer

Há um bom tempo o Sul do País passou a ser corredor de passagem para grandes shows internacionais que cruzam pelo Brasil e América do Sul. E quando falamos em Rio Grande do Sul, é óbvio que estamos nos referindo a Porto Alegre, capital gaúcha que já foi palco de centenas de apresentações de estrelas maiúsculas da música mundial. No entanto, em 11 de Novembro de 2011 (11/11/11), uma data ‘cabalística’ associada a supostos eventos apocalípticos (que não se concretizaram), Santa Maria é premiada com uma noite histórica. Urbe localizada fora do palco central dos acontecimentos, de forma inédita, o Avenida Tênis Clube (ATC), um dos mais tradicionais clubes da cidade da Região Central, recebe um dos gigantes do rock nos anos 1970/80, a banda escocesa Nazareth. Em duas horas de espetáculo, o quarteto manifesta várias adjetivos que fazem parte do ideário que todo bom grupo de hard rock deve ter. No caso da banda, além das sempre esperadas e tradicionais baladas (foram apenas cinco, para decepções de muitos), acima de tudo, os britânicos alternaram canções mais recentes com uma penca de rocks encardidos, espólio responsável por tornar o Nazareth uma lenda do nosso tempo.

Foto: Fabiano Dallmeyer

Três minutos passados da meia noite, ou seja, já estamos no dia 12 de Novembro e o mundo não acabou! Tudo começa com acordes de gaitas de fole, uma melodia derivada do hit “Hair of The Dog” mesclada a um tema folclórico anglo-saxão. Nazareth no palco, “Silver Dollar Forger”, coloca o pé na porta e nos avisa: “estamos num show de hard rock!”. “Big Dogz Gonna Howl”, faixa de abertura do disco “Big Dogz”, de 2011, é prova vívida de que o Nazareth ainda tem um bocado de lenha para queimar. O guitarrista Jimmy Murrison, nas fileiras desde 1994, tem a árdua tarefa de substituir o virtuoso Manny Charlton, membro fundador do Nazareth. Com sua Gibson Les Paul reluzindo frente às luzes, a presença cênica do músico pinta um retrato de arquétipo do gênero: pose, timbre, volume e proficiência em jogar a guitarra na linha de frente das canções. “This Month Messiah” única joia faiscante do fraco “The Catch”, de 1984, faz um ansioso espectador ao meu lado perguntar: “Cadê as baladas?”. A resposta bate cartão quando o vocalista Dan McCafferty joga a peteca para a plateia: “Vocês são românticos?”. O sonoro “yeahhhhhhh” da audiência se mixa violão de “Sunshine”, um dos hits absolutos da trajetória dos escoceses.

Foto: Fabiano Dallmeyer
“Vamos ao boogie woogie?”, provoca Dan. Mais lenha seca na fogueira com “Turn On Your Receiver” um hardzão danado de bom advindo do álbum “Loud N’ Proud”, de 1974. O que ouvimos trata-se de uma versão mais comportada que a original, eu diria, relaxada, até decepcionante. Nada como uma faixa após a outra, pois o guitarrista volta ao violão em “See Me”, número que se tornou um dos vídeos oficiais da banda, e boi de piranha do álbum “The News”, de 2008.

Entretanto, a casa cai quando a massa reconhece os primeiros acordes de “Love Lead To Madness”, single de 1982. O tema é responsável por colocar o grupo no horário nobre na TV brasileira, pois fez parte da trilha-sonora da novela global “Sol de Verão“, tornando-se um dos maiores sucessos do Nazareth no país. “Radio”, outro destaque de “Big Dogz”, mantém a bola quicando nas alturas. Do mesmo pacote, “When Jesus Comes To Save The World Again” é uma daquelas faixas introspectivas, ligação a nos preparar para o clímax que nunca acontece. Pelo menos por enquanto... “This Flight Tonight”, mais uma de “Loud N’ Proud”, releitura da cantora canadense Joni Mitchell, pude assistir do backstage. E assim, numa visão privilegiada, dá pra sacar que aos 65 anos, Dan McCafferty parece ter problemas. Ele faz paradas estratégicas para buscar fôlego num balão de oxigênio. Em outro viés, antagonicamente a essa fragilidade, Dan continua sendo o principal emblema da banda, carimbando essa representação como band lider legítimo. E tenha certeza: o vocalista ainda canta muito!

Foto: Fabiano Dallmeyer

Uma curiosidade: um dia antes do show (sexta, 10), para desespero da produção, Dan deixou se perder pelas ruas de Santa Maria. Ele foi encontrado várias horas depois de ter desaparecido de seu quarto - estava num boteco localizado na periferia. Tudo certo, ciceroneado por um fã local, o escocês circulou de boa pela city, reconhecendo território, interagindo com os santa-marienses, além de provar algumas das delícias etílicas do sul do Brasil: “Levei Dan e Robert Kennedy (falecido integrante do entourage do Nazareth) para um passeio pela cidade. Engraçado foi termos avistado um ônibus com a inscrição ‘Kennedy’ e ver Dan sair correndo atrás para tentar fazer uma foto (apenas para tirar sarro do Robert). O motorista se partiu de tanto rir. Deve ter pensado: quem são esses loucos’?”, relatou Danilo ‘Nazareth’, fã curitibano e cicerone da dupla de gringos em Santa Maria. Voltando ao set, já que o veterano demostra estar exausto, será que mais um hit pode ajudá-lo? Cerca de 1.500 vozes fazem coro a “Dream On”, outro daqueles sons que podem ser considerados como cânones do pop baladeiro. Dan já pode recuperar seu fôlego. 


Foto: Fabiano Dallmeyer
Chega então o momento do Nazareth reivindicar seu reingresso na primeira divisão do hard rock. O soco no estômago vem com a tríade de sons pesados do mega-platinado “Hair of the Dog”, de 1975. De cara, “Whisky Drink Woman”, um blues carregado de peso, nos deixa com aquela sensação de que realmente estamos assistindo um monstro sagrado do gênero. Detalhe: poucos baixistas tocam tão bonito como Pete Agnew. O veterano instrumentista de 65 anos tem uma postura clássica no palco, ao nível de colegas como John Deacon (Queen) e Roger Glover (Deep Purple). Além disso, ao lado de Dan, é um dos membros originais remanescentes. Já ”Chansing Times” é plataforma perfeita para Jimmy Murrison abrir a ciaxa de ferramentas e detonar o ATC.

E por último, a faixa título, “Hair of the Dog” (em inglês: “pelo do cachorro”) uma expressão que justifica a prática de ingerir bebida alcoólica para curar a ressaca da mesma garrafa, derivação da expressão “hair of the dog that bit you” (“o pelo do cachorro que te mordeu”). Trocando em miúdos - a melhor cura para algo que lhe aflige é um receber um pouco mais dessa mesma maledicência. Eis o veneno que recebemos dos legítimos escoceses! O tema começa com as pancadas firmes das baquetas de Lee Agnew. O músico de 40 anos, ex-roadie e mais jovem integrante da banda, é filho de Pete. Adentrou no Nazareth em 1999, logo após o baterista original, Darrel Sweet, morrer de enfarte. Isso minutos antes de um show em Indianápolis, nos EUA! E vamos lá, "Hair of the Dog” é a música dos sonhos de qualquer baterista. Esse também é o momento que Dan toca seu solo de gaita de fole, instrumento típico da Escócia. A museta surge acoplada a um talk-box (dispositivo utilizado para dar um efeito similar a voz em instrumentos musicais, normalmente guitarras). Um espetáculo! 

Foto: Fabiano Dallmeyer

Eis que, já rumando para o fim da apresentação, temos outro recorte especial. Dois dias antes do evento, durante a coletiva de imprensa no Hotel Cura, o vocalista falou de um fã que enviou vários e-mails para a produção da banda, insistindo para que o quarteto tocasse a balada “When Are You Now?”, pérola do LP “Sound Elixir” de 1983. O Nazareth não apresentava ao vivo essa música a cerca de 30 anos! O garoto do e-mail estava lá com sua faixa gigante reforçando o pedido. Ele se deu bem. A nova versão excluiu o piano da versão original e deixa a responsabilidade para o guitarrista. Com o público em êxtase, eles dão aquele falso tchauzinho que antecipa o bis. 


Foto: Fabiano Dallmeyer
E para delírio geral dos presentes no ATC, Dan McCafferty volta ao palco vestindo uma camiseta do Riograndense, tradicional clube santa-mariense de futebol. Jogo ganho. E eles recomeçam com toda a sujeira à mostra em “Razamanaz”, desde sempre, um dos melhores sons pesados do Nazareth. O ATC vira uma celebração. De repente, temos um autêntico “Bailinho da Saudade”, isso quando a audiência identifica os primeiros acordes de “Love Hurts”. Transe. A canção dos Everly Brothers, regravada pelo Nazareth em 1975, tornou o grupo conhecido nos quatro cantos do mundo. Agora sim, fechem as cortinas e mandem esse povo para casa, às lágrimas, é claro! Entretanto, o Nazareth entrega o dropes final com a fraquinha “We Are Animals”. Anticlímax? Que nada! Olho no relógio, 01h58min, horário exato em que realmente tudo termina. Aclamado, o quarteto escocês sai de cena.  E como disse um amigo: “Assistir ‘Love Hurts’ ao vivo, no quintal de casa, e ainda com o vocalista vestindo a camiseta de um clube da minha cidade?!”. Um mundo que diminui de tamanho.
Foto: Fabiano Dallmeyer
Atualização (2018) ☆☆☆☆☆

Uma curiosidade: em Agosto de 2013, o vocalista Dan McCafferty descobre que sofre de uma doença pulmonar crônica e decide pendurar as chuteiras. Alguns meses depois, Linton Osborne é anunciado como novo vocalista da banda. Após um ano de atividade, em Fevereiro de 2015, o Nazareth anuncia Carl Sentance (Persian Risk, Geezer Butler Band, Krokus), como novo front man. Resumo da ópera: o público santa-mariense testemunha uma das últimas apresentações de Dan McCafferty à frente do grupo.

O último álbum do Nazareth é "Tattooed On My Brain”, lançado em Outubro de 2018. Já Dan McCafferty, segundo informações, prepara novo álbum solo, o terceiro de sua carreira, ainda sem data de lançamento. Quem viver verá.


Foto: Fabiano Dallmeyer

Foto: Fabiano Dallmeyer

Foto: Fabiano Dallmeyer


Um comentário:

  1. O passeio pela cidade com Robert Kennedy (IN MEMORIAN) e Dan Jonny foi muito engracado pois avistamos um onibus com o nome do Kennedy e o Dan saiu correndo atras para tirar foto,o motorista se partiu de tanto rir,pensando quem sao esses loucos...

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